segunda-feira, 28 de julho de 2014

Exorcismos - como entendê-los?


 Por Cesar Kuzma – teólogo

O tema do exorcismo não é um tema que me atrai enquanto teólogo nem como cristão. Não porque não acho relevante, mas porque acredito que já é um caso superado para a teologia e em grande parte para a Igreja Católica e para muitas das demais Igrejas cristãs. Sei que ainda hoje, algumas igrejas cristãs e alguns movimentos da Igreja Católica persistem em tal prática e insistem com seus argumentos. No entanto, eu, em minha opinião, e também, respeitando as demais, vejo que isso já é algo superado.

Os relatos que temos na Sagrada Escritura e na tradição da Igreja devem ser vistos dentro de um horizonte cultural que foi próprio de uma época, refiro-me aqui ao período contemporâneo de Jesus e o caminhar da história até a Idade Média e princípios da era moderna. Há em todas essas expressões uma construção sociocultural e religiosa em cima disto, hoje, seguramente, temos outra interpretação (religião e ciência não se excluem, mas podem comungar e servir em benefício do ser humano e do mundo). Não podemos conceber uma ideia fora do contexto que nós estamos e não podemos ler uma ideia do passado a partir do nosso contexto cultural, social e religioso. Cada época está alicerçada por uma visão cosmológica (visão de mundo), para tanto, deve-se buscar compreender o todo da questão. É certo que na época de Jesus havia um panorama favorável a esta prática: muitas doenças não eram explicadas; muitos sintomas psicológicos nem eram cogitados e sequer conhecidos; a visão de mundo e de ser humano era diferente; a questão religiosa estava na base da sociedade, era ela, pois, que determinava os princípios e que trazia as explicações sobre o ser humano, sua origem e fim, sobre o contexto social etc.

Quando os relatos bíblicos nos contam a atuação de Jesus, suas curas e exorcismos nós temos que enquadrá-los dentro desse contexto, se não fizermos isso estaremos interpretando erroneamente o fato ocorrido. Além disso, temos que ter em mente que os evangelhos não são relatos de história, mas testemunhos de fé. O que isso significa? Significa que a presença de Jesus em meio ao povo provocava uma mudança. Significa que ele trazia algo novo, que trazia o bem, que cultivava o amor etc. No encontro da pessoa com Jesus a sua vida era transformada e começava-se uma vida nova, com um novo sentido, dentro de uma nova perspectiva. Havia uma ruptura do “antigo eu” com o “novo eu”. É possível sim que Jesus também tenha entendido que estava exorcizando, mas temos que ter em mente que ele estava inserido num contexto; devemos entender que ele não era um ser isolado do mundo, mas atento ao mundo, por sua vez, influenciado por ele. Nisso, não há nenhuma blasfêmia contra Jesus, ao contrário, é doutrina cristã, é dogma de fé que ele era verdadeiramente humano e verdadeiramente Deus. Crescia em idade, sabedoria e graça, diante de Deus e de todos (cf. Lc 2,52). Ele assumiu “toda” a condição humana. Segundo a fé cristã, é por isso que podemos ser salvos (cf. Fl 2,6-9).

A mensagem de Jesus Cristo que deve vigorar nas Igrejas cristãs é a “Boa Nova” do seu evangelho. Este é o pano de fundo da questão. É por aí que devemos entender aqueles “exorcismos” e não num sentido figurativo, demoníaco e paranormal. O mesmo ocorre com o desenvolvimento destas questões durante a história do cristianismo. Todos os fenômenos devem ser vistos dentro do ambiente em que foram construídos. Isso tudo sem contar as influências de outros povos, de outras culturas e de outras religiões. No atual momento em que estamos vivendo nós não podemos ignorar os avanços que tivemos em nível de reflexão teológica, antropológica, científica e, neste caso, principalmente, psicológica. A teologia reflete a partir do “senso de fé” da Igreja, que também esse é produzido em um ambiente cultural e religioso próprio. Neste ponto, a teologia também tem uma responsabilidade para com a Igreja de educar – e reeducar – em alguns conceitos. Muitos dos fenômenos tidos hoje como "paranormais", como "possessão demoníaca" podem ser compreendidos em nosso contexto através de outros elementos psicológicos, antropológicos, científicos, sociais e culturais. Estamos num momento de complexidade e não há uma resposta pronta para tudo. As pessoas estão num mundo complexo e se sentem complexas também. Muitas vezes procuram algo, uma resposta, um sentido e não encontram. Não conseguem mais olhar para dentro de si mesmas e, como consequência, criam-se eventos e situações que aparentemente produzem uma fuga ou uma leve compreensão da realidade. Isso talvez explique alguns eventos que ocorrem atualmente. Não os vejo como possessões, para mim, isso é algo superado. Forçar a isso pode levar ao fundamentalismo e ao fanatismo, ambos ruins para a religião e para a sociedade.

Tais eventos devem encontrar uma resposta plausível na existência humana e na racionalidade. A fé não deve se encontrar fora da razão, ao contrário ela ancora-se nela para fundamentar a sua experiência. O ser humano é livre para decidir-se no mundo. Deve, também, com isso, assumir as consequências da sua decisão. O ser humano é um ser influenciável, deve, contudo, buscar um escape e encontrar a sua verdadeira razão de ser. O ser humano é um ser em meio a máquinas e estruturas que, às vezes, o posicionam contra si mesmo, contra o próximo, contra o mundo e contra Deus. Talvez estes sejam os “demônios” de hoje. Eis aqui algo que deve ser considerado. A palavra “Dia-bolos” representa aquele que divide. Tudo o que causa divisão no ser humano ou rompimento com a sua razão de ser torna-se isso. Obviamente, podemos perceber que não se trata de um “ser” ou um “ente” que determinam as nossas decisões, mas de uma estrutura, tanto psíquica quanto sociocultural e, também, religiosa.

 
Cesar Kuzma é autor do Livro “O futuro de Deus na missão da esperança: uma aproximação escatológica”, da Editora Paulinas.

sábado, 3 de maio de 2014

Minha experiência como Leigo na Igreja - Testemunho pronunciado na 52ª Assembleia da CNBB, em Aparecida, dia 01/05/2014




Por Cesar Kuzma – Teólogo PUC-Rio




A minha intenção a seguir é, de maneira bastante breve, esboçar alguns pontos que possam favorecer a discussão sobre o tema em questão. Trarei isso de modo sistemático:

1. A importância da CNBB falar sobre este tema

A CNBB sempre foi referência por estar na vanguarda e por aplicar nas suas ações e diretrizes as grandes novidades conciliares, fortalecendo o serviço da Igreja ao mundo, sendo sinal, um sinal realizador. Portanto, falar sobre os Leigos, dedicar uma Assembleia e um ano a esta vocação (até mesmo mais um documento) é, na verdade, reconhecer aqueles e aquelas que estão em maior número no corpo eclesial (a maioria) e que não querem (e não devem) mais ser tratados de maneira passiva, como aqueles que sempre ouvem e recebem, ou como o povo conquistado... Os Leigos de hoje, apontamos aqui todos os que assumem verdadeiramente a sua vocação e missão, querem ser verdadeiros discípulos missionários, querem (e devem) ser tratados naquilo que o batismo lhes garante por direito, eles querem ser sujeitos eclesiais. Podemos dizer que eles têm o “direito” de ter “dever”, e este dever é um serviço colocado para a edificação da Igreja e para o serviço do Reino, um serviço no mundo. Os Leigos querem exercer a sua autonomia, garantida pelo Vaticano II e que reflete uma maturidade eclesial, exigida a toda a Igreja. Sabemos que muitos são os desafios e grandes são os contextos, tanto sociais quanto eclesiais.  Mas nos alegra e nos encoraja saber que os Bispos do Brasil, em comunhão com toda a Igreja, estão decididos em seguir este caminho. Parabéns! E Coragem! Nas palavras de Francisco: “Ousem e primeireem!”. Precisamos disso!

2. Quem sou eu e qual é o meu objetivo aqui

Meu nome é Cesar Kuzma, sou leigo, melhor dizendo, um cristão-leigo. Tenho 37 anos de idade, sou casado há 11 anos e minha esposa chama-se Larissa, ela é Assistente Social. Nós temos dois filhos: a Julia, que tem 2 anos e 6 meses, e o Daniel, de apenas 11 meses. Digo a vocês que a família é o que temos de mais precioso e, também, é o que temos de mais sensível, pois tudo a atinge e nela devemos ser sempre zeladores, cuidadores da vida que nos foi confiada e que é a nossa missão, mas ao mesmo tempo devemos ser promotores da justiça e da dignidade para todos. A vida familiar hoje nos coloca novos desafios e nos faz pensar, de maneira aberta e conscienciosa o novo papel da mulher, o novo papel do homem, a nova condição dos filhos, e a situação de todos os que da família fazem parte e que dela se aproximam. Se a sociedade hoje é plural, esta noção obriga a família, enquanto Igreja doméstica, ao exercício da acolhida, do respeito e da promoção humana; sem reducionismos, sem fundamentalismos ou extremismos. O exercício do Amor, que sacramenta esta união e condição eclesial, nos abre a esta perspectiva.

Minha trajetória eclesial começa por influência de minha mãe, uma mulher guerreira, leiga engajada e comprometida, líder de pastorais e de comunidades eclesiais. Uma mulher que sempre se colocou em serviço e sempre nos ensinou a servir, a colocar-se a caminho, em marcha, sem aparecer, mas na simplicidade e no testemunho. Fui membro da Pastoral de Juventude, onde iniciei a minha caminhada, expressão da Igreja a qual sou bastante simpático e é um berço de bons cristãos e de boas vocações, autênticas e proféticas com a causa do Reino. Os ensinamentos de minha mãe e a experiência de Pastoral me levaram a outros grupos, onde pude aprender e dar um pouco mais de mim mesmo. Isso me levou às comunidades, às ações pastorais e sociais, às palestras e assessorias a grupos de jovens, de casais e de pastoral social e cultural. Tenho orgulho do caminho que fiz como leigo e digo que não saberia ser Igreja de outra maneira. Acho sublime, e me encanta saber que a condição batismal, muito bem descrita na Lumen gentium nos garante esta plenitude. Vejo no ser leigo algo peculiar, que o mantém aberto ao horizonte do Reino proclamado por Jesus, que também era leigo, e por ser leigo estava inserido no contexto de seu tempo e foi em seu tempo, e para os seus, um autêntico testemunho; trouxe a todos o novo rosto de Deus, um Deus próximo e solidário, um Deus que se despoja para nos atingir, que vem até nós e que nos ama, um Deus que é Amor. Assim é o Leigo, é alguém que está no mundo, que se despoja para estar nele, que é rosto da Igreja no mundo e o rosto do mundo na Igreja, como atestou a Conferência de Puebla, e Aparecida repetiu e reafirmou.

De minha mãe, já falecida (jovem aos 58 anos e praticamente nos meus braços), aprendi a seguinte lição: 1) Caminhar com Cristo; 2) surpreender-se por Cristo; 3) e, o continuar a obra de Cristo, o Reino de Deus. Para ela, isso se fazia servindo.

Esta experiência comunitária e de pastoral me levou à Teologia. E fiz este caminho por influência de Clodovis Boff, a quem tenho muito estima e respeito. A graduação me levou à pós, ao mestrado e ao doutorado. Atuei como professor da PUC do Paraná por 7 anos, sendo 5 anos como diretor. E hoje desembarco no Rio de Janeiro, também na PUC, para exercer ali um ministério e uma pastoral. É a Teologia a serviço da Igreja, um serviço no discernimento crítico de nossa vocação e missão.

3. Algumas questões que nos tocam enquanto leigos e que pude vivenciar, mesmo com pouca idade.

A questão do clericalismo. O Papa Francisco tem falado insistentemente sobre isso, falou aqui no Rio, tem falado em suas homilias e deixou registrado na Exortação Evangelii Gaudium. Isso não nos é novidade, pois há tempos já se fala sobre este assunto, mas algo precisa ser feito. O problema do clericalismo é que ele nos leva a ver a Igreja apenas por um lado, não se vê o todo e facilmente se cai na esfera do poder, não do serviço. Isso aparece em atitudes do clero, mas também nos leigos, quando falta maturidade e a experiência pastoral parece turva. Tal questão dificulta o exercício da vocação  laical, pois impede o seu desenvolvimento, retira a sua autonomia e não implica no respeito e na comunhão, não gera fraternidade.

A relação entre leigos e hierarquia. É necessário dizer que há bons frutos desta relação e há bons caminhos percorridos, mas isso não é uma regra. Em algumas situações, notamos que o contato é áspero. Vejo isso muito mais como um efeito cultural do que intencional. Chego a dizer que o clero, em parte, acostumou-se a viver independente do leigo, ou a tê-lo em seu domínio; já o leigo, por sua vez e em parte, acostumou-se por ficar dependente do clero, por ser mais cômodo, talvez, o que não gera inquietação e compromisso. A falha está nos dois lados e apenas uma maturidade de ambas as vocações pode mudar esse quadro.

O trabalho do leigo na Igreja. O que é? O que se quer dele? Sempre fui levado a trabalhar na Igreja pela experiência e vivência de minha mãe. Vi a Igreja como uma extensão de minha casa, e a minha casa sempre foi uma extensão da Igreja, sempre presenciei isso, principalmente pelas inúmeras atividades que minha mãe exercia em sua comunidade. Mas acompanhando de perto, vem a nós a pergunta: “a quem servimos com o nosso trabalho?”. “Como somos vistos e de que maneira o nosso trabalho, como um serviço eclesial/missionário/pastoral é importante?”. Falta aqui uma intencionalidade mais clara por parte da instituição e também por parte dos leigos, que atuam de coração aberto, livres e de boa vontade, sempre querendo agradar. Falte, talvez, um reconhecimento, em vários níveis. É importante deixar claro que o seu trabalho não é um plus a mais, não é uma extensão ou um apoio, não é apenas suprimir uma falta... O seu trabalho é um apostolado, pois é o próprio Cristo que o chama e o garante em sua missão e o leva ao bom exercício da mesma, através do seu Espírito. O Concílio Vaticano II afirma que os Leigos não estão sós e que sua missão não é em vão, maneira como termina o Decreto Apostolicam actuositatem.

A questão ministerial. É o que nos leva a uma questão urgente e importante que, penso eu, deve ser tocada por esta Assembleia, não apenas nesta ocasião, mas em outras, e cada vez de modo mais profundo. O que entendemos e o que queremos entender por ministério? Aproveito aqui a presença do teólogo Bruno Forte que muito tem se dedicado a isso. Faz-se necessário ampliar a compreensão que temos de ministério, pois o mesmo está muito focado na sacramentalidade e no ministro ordenado, e não se completa na condição do trabalho e do serviço de toda a Igreja. Ou seja, a quem se destina e a quê? Se focarmos o ministério apenas, ou com um reforço maior, na sacramentalidade, tornamos a comunidade refém de parte do clero, ou mesmo infantilizada na fé; e esta não é a intenção que se quer para os ministros ordenados. Com isso, a Igreja não atinge a sua identidade missionária, para a qual convoca todos os batizados, cada membro do seu corpo, cada qual com seu dom e carisma, e é o mesmo Espírito que sustenta a todos e todos corroboram para a edificação da Igreja e para o crescimento de todos. Faço lembrar que o documento 62, que já trabalhou a questão do laicato, e diga-se bem, de maneira profunda, já aborda a questão da ministerialiade, chegando até a ousar. Penso que as necessidades de nossas comunidades e de nossas periferias, que no Brasil são longínquas, exigem de nós algo mais ousado. O contexto eclesial que irrompeu com o Papa Francisco nos provoca a esta questão.

A questão da formação, sobretudo, a teológica. Para este momento gostaria de trazer um pouco da minha experiência de universidade e de gestão de curso de teologia. É um fato que os cursos de Teologia não são destinados para uma vocação específica. A formação e o entendimento teológico são necessidades de toda a Igreja que busca entender o que crê; e, entendendo, tem a capacidade de discernir e, por isso, pode servir mais e melhor. No entanto, é uma realidade que por muito tempo se deu uma importância maior para a formação teológica dos seminaristas e religiosos e se deixou de lado a formação teológica dos leigos; ou quando era oferecida, não tinha o mesmo frescor e não abordava os mesmos conteúdos, pelo menos não em totalidade ou em profundidade. Isso mudou com os anos, e hoje, principalmente pelo bom desenvolvimento da formação catequética e pelo aumento (e de qualidade!) dos cursos de Teologia no Brasil, sobretudo os que são reconhecidos pelo MEC, temos um número grande (talvez até maior) de leigos que buscam a formação teológica. Vejo isso como louvável, pois o interesse pelo qual buscam não é o de uma obrigatoriedade, como um passo necessário para ordenação ou votos religiosos, mas o entendimento, o amor a Cristo e à Igreja, o serviço. Tenho acompanhado muitos leigos entrarem em cursos de graduação trazendo para estes a riqueza de suas vidas, de suas experiências e de sua outra formação. Fazem da Teologia um espaço público e de diálogo, não de respostas prontas; e neste espaço eles a colocam na prática e no serviço. Contudo, nem tudo são flores neste jardim... As dificuldades que os leigos enfrentam são maiores e mais graves, pois não recebem apoio institucional, não recebem incentivos e ajudas financeiras de suas comunidades e dioceses (salvo algumas exceções), precisam acomodar os estudos com os afazeres do trabalho (em horários difíceis) e com a guarda familiar, algumas vezes precisam pedir tutela (declarações) do bispo ou do pároco para poder fazer este curso, o que tira a sua autonomia; e muitas vezes, não são privilegiados com bolsas em instituições católicas, como acontece com os seminaristas, o que não é apenas uma falta apenas para com estes cristãos comprometidos, mas com toda a Igreja que necessita “urgentemente” de formação, ressalto aqui uma formação que seja aberta e capaz de dialogar, nunca, jamais de enfrentamento e de fechamento.

(os dois pontos seguintes foram apenas comentados, não lidos, devido ao tempo)
Continuando... Eu enfrentei este problema quando dirigi o curso da PUC de Curitiba. Tínhamos um excelente curso, mas pouquíssimos alunos. Na ocasião, em 2012, conversei com Dom Moacyr José Vitti, conversei com a Pastoral da Arquidiocese e conversei com a Reitoria e com o Provincial dos Irmãos Maristas (que administram a PUC). Consegui convencê-los da importância eclesial deste curso e de como estava ligado à missão institucional. Resultado: fechamos numa bolsa de quase 90% para todos os alunos, deixando a mensalidade em R$ 150,00, em Curitiba e em Londrina. Isso para todos: leigos, religiosos, seminaristas, ricos ou pobres, e também a nossos irmãos protestantes, a todos. Resultado: abriram-se turmas cheias em Curitiba e em Londrina, e isso se repetiu no ano seguinte. E mais, quase 80% são leigos e leigas.  Este exemplo poderia ser repetido em outros lugares, ou se poderia ver mais exemplos parecidos e criar novas perspectivas. É certo que o lado financeiro não garante o todo, mas alguém tem que puxar este braço e oferecer, e quem pode mais, ajudar quem não pode tanto.

Ainda sobre a formação: falo por experiência na gestão do curso de Teologia. Eu entendo as razões que no passado se levou a separar a formação seminarística da formação laical, em alguns casos, até da feminina. Todavia, em vista da questão do mundo de hoje e da necessidade de se fortalecer a dimensão de Povo de Deus na Igreja, isso não se justificaria mais. Seria um avanço muito grande se pudéssemos ter em uma mesma sala leigos, religiosos e seminaristas. Isso engrandeceria muito. Precisaria, evidentemente, respeitar o espaço de cada vocação e favorecer também (e isso nos falta!) aspectos e disciplinas teológicas que favoreçam aquilo que é específico da vocação laical, a sua atuação no mundo secular. Ressalto aqui, que a formação universitária não é a única forma de se buscar conhecimento e aprofundamento da fé. Faz sentido e é também urgente fomentar a formação em vários níveis, também pastoral e popular, na experiência e na mística, em cada pastoral e em suas especificidades, de modo que o entendimento do “ser” e do “fazer” cristão se tornem uma realidade. A Igreja ganharia muito se acolhesse também a sabedoria de muitos leigos e leigas, testemunhas vivas do Evangelho e que marcam a vida de pessoas e mais pessoas. Tive isso com a minha mãe.

(Este final foi lido)
4. Para finalizar:
Digo a vocês que os leigos querem servir, e precisamos ajudá-los a isso, para que sejam verdadeiros sujeitos eclesiais, que atuem como luz do mundo e sal da terra. Os leigos não querem ocupar um espaço que não lhes pertence; eles querem ocupar um espaço que corresponde a sua vocação e missão, a fim de que possam exercê-la e santificar-se, sendo testemunhas do Reino no mundo, com autencidade e coerência, no serviço.

Digo, aos senhores Bispos, que não é fácil ser leigo. Na nossa frente as portas ficam mais fechadas do que abertas e nem sempre nos estendem a mão, nem sempre nos escutam, nem sempre nos olham no rosto e nem sempre podemos falar. Por isso, agradecemos esta oportunidade e de antemão agradecemos os frutos desta Assembleia. Não queremos alimentar ressentimentos, queremos servir. No movimento de Francisco, nós também queremos sair! Queremos primeirear! Sair enquanto Igreja! Uma Igreja em saída!

Que o Espírito da comunhão favoreça o nosso entendimento e nos leve a servir, como Igreja, como Povo, como Povo de Deus.

Obrigado!


Cesar Kuzma
PUC-Rio
Aparecida/SP, 01 de maio de 2014
Cesar Kuzma é doutor em Teologia pela PUC-Rio e Professor/Pesquisador desta mesma Universidade. É autor do livro “Leigos e Leigas”, da Editora Paulus.